MISTÉRIOS DA VIDA
Quando criança minha mãe sempre me dava um brinquedo e um livro, sendo que eu apenas podia brincar com minha nova aquisição se prometesse a ela que iria ler o livro que tinha vindo junto com meu brinquedo. No inicio eu não gostava muito, mas com o passar do tempo fui deixando de lado a vontade de ganhar brinquedos e almejava apenas o momento de virar as páginas de um novo livro e viajar nas histórias que ele continha. Foi assim que aprendi a gostar de ler e sou eternamente grato à minha mãe por ter me mostrado que é possível viajar sem sair de casa.
Em uma dessas minhas viagens, aos 13, 14 anos, não me lembro com precisão, me deparei com um texto muito interessante sobre Santo Agostinho.
O texto falava que Santo Agostinho estava caminhando em uma praia tentando compreender a Santíssima Trindade. Andava pra lá, anda pra cá e não conseguia entender “como um só Deus pode ao mesmo ser três.” Em meio as suas reflexões ele se deparou com um menino que, ao terminar de cavar um buraco na areia, pegou um pequeno recipiente, foi até o mar, encheu o mesmo com água e voltou para colocar a água no buraco que havia cavado. Diversas vezes o menino realizou este procedimento, sendo que Santo Agostinho, desejando saber o que o menino estava fazendo, foi conversar com o mesmo e perguntou:
- Menino, o que você está fazendo?
A esta indagação, a criança respondeu:
-Padre, estou tentando colocar toda a água do oceano neste buraco que eu cavei aqui na areia da praia.
Achando graça da inocência do menino, Santo Agostinho lhe disse:
- Criança, você não vê que isso não é possível? Além de o oceano ser muito grande, toda vez que você colocar água no buraco que você cavou a areia da praia vai sugá-la.
Tendo ouvido isso, o menino respondeu:
- Agostinho, Agostinho, saiba que é mais fácil eu conseguir colocar toda a água deste vasto oceano neste pequeno buraco do que a infinidade da Santíssima Trindade entrar dentro da sua cabeça.
Ao dizer isso, o menino desapareceu.
Na época em que li este texto pela primeira vez não pude captar toda a beleza e magnitude dos ensinamentos que ele continha. À primeira vista alguém poderia dizer que ele serviria apenas para uma discussão religiosa, tendo em vista que Santo Agostinho era um padre da Igreja Católica. Mas se você realmente ler com atenção o texto acima mencionado, você vai conseguir enxergar que ele serve para muito mais, pois a sua essência está no fato de que existem coisas que a razão não consegue explicar e por mais que tentemos empreender esforços homéricos nessa cruzada, existem mistérios que estão à nossa frente, além de nossas capacidades.
Aceitar este fato, de que nem tudo aquilo que habita o mundo do ser possui uma conseqüência lógica, representa um grande passo para o aprendizado humano.
Não quero dizer, contudo, que a razão deva ficar inerte, até porque o sentido básico de evolução consiste na idéia de movimento. O que defendo, e acredito verdadeiramente, é que não devemos gastar o nosso precioso tempo tentando entender coisas que ainda não estamos prontos para saber.
Veja, por exemplo, o caso do amor. Quantos não foram as almas que foram consumidas com o desejo de conceituar este sentimento, quanto tempo não perderam escrevendo páginas e mais páginas sobre algo que nem estavam sentido, quando bastou apenas uma frase, uma pequena frase para transmitir toda a essência, toda a magnitude deste sentimento: “o amor é força mais sutil do mundo (Gandhi).”
Os mistérios da vida são inúmeros, é preciso paciência e perseverança para compreendê-los, e mais importante, é preciso sabedoria para aceitar que nem tudo pode ser explicado da maneira que bem entendemos.
Uma boa semana e um forte abraço.
Rodrigo Gadelha